O Ministro das Finanças disse que apesar de as taxas do IRS irem baixar para os rendimentos de 2005, essa baixa não se iria ainda reflectir no imposto que é descontado (retido na fonte) aos trabalhadores dependentes e aos pensionistas.
Já noutro post demonstrámos a ilegalidade das intenções do Ministro. Aquilo que ele vem dizer é que as entidades patronais nos vão descontar a título de IRS, mais do que a lei permite.
A cumprir-se a “palavra” do Ministro, essa retenção na fonte vai ter então duas componentes: A legal e a ilegal. A legal é um pagamento antecipado do IRS do próprio ano de 2005, previsto no Código do IRS. A lei manda efectuar a retenção com base nas taxas do IRS aprovadas pela AR (artigo 98.º, n.º 3 do Código do IRS, tendo em conta a nossa situação familiar, os abatimentos médios a dedução específica e à colecta – DL 42/91, de 22/1)
A ilegal é o que está para além disso, que resulta das intenções do Ministro, e que depois nos será devolvida sob a forma de reembolso em 2006.
Trata-se de um esquema engenhoso, aparentemente inofensivo. Entre Janeiro e Dezembro de 2005 descontam-nos mais do que o devido por lei, e depois devolvem-nos esse excesso lá para o 3.º trimestre de 2006.
Só que além de isso ser ilegal, tem dois problemas graves:
O primeiro é que o Estado nos está a ir ao bolso. Se ao longo de todo o ano o governo me desconta mais IRS do que aquele que eu devo pagar, então o meu ordenado é mais baixo do que aquele a que tenho direito.
O segundo é que a receita do IRS que vai para as contas públicas está falsificada. O Estado está a contabilizar em cada ano como receita do IRS, essa parte ilegal da retenção na fonte. Claro que no ano seguinte, a receita baixará na mesma medida. A não ser que no ano seguinte as retenções de IRS se façam também ainda mais acima do que a Lei permite, e assim sucessivamente.
Ou seja, o Estado vai antecipando receitas de anos seguintes.
A declaração do Ministro fez-nos ir ver às contas da execução orçamental, se o governo está a fazer isso, e descobrimos que está. Vejamos então:
A receita mensal de IRS recebida pelo Estado deve ser uniforme, dado que essa receita resulta dos salários e pensões pagos, que são estáveis ao longo do ano. Só nos meses de Julho a Setembro, quando o Estado recebe o IRS dos empresários em nome individual, dos profissionais livres, é que essa receita devia ser superior.
O gráfico seguinte demonstra-nos a evolução da cobrança mensal de IRS ao longo do ano 2004. As colunas contêm a receita efectivamente cobrada, segundo o boletim mensal da Direcção-Geral do Orçamento (os referentes a Novembro e Dezembro são previsões).
A linha reflecte a cobrança média mensal.
Como se constata, a receita recebida pelo Estado é relativamente uniforme ao longo dos meses do ano. Mas no 3.º trimestre, em vez de aumentar, por efeito do pagamento do imposto pelos profissionais livres e empresário individuais, baixa inexplicavelmente.
Ao ponto de em Agosto ser negativa!
Mas há uma razão para isso: É que é nesses meses que o fisco paga os reembolsos do IRS. Esses reembolsos correspondem ao imposto retido na fonte no ano anterior, acima do que a lei permite.
A diferença para menos entre os 615 milhões de euros que é a média da receita mensal e os 357 de Julho, -48 de Agosto e 213 de Setembro, é a receita que o Estado recebeu a mais em 2003, e que está a devolver em 2004.
Repare-se bem que no total são 1.322 milhões de euros, 264 milhões de contos na moeda antiga. 18% da receita total do IRS. Significa isto que o Estado está a contabilizar indevidamente 18% da receita fiscal do IRS. Aproximadamente 1% do PIB. Ao défice real, há que acrescer agora este buraco.
Dir-me-ão: Mas se o Estado devolve o dinheiro em 2004, já não o contabiliza. Mas contabilizou-o indevidamente em 2003. E quanto a 2004, o problema resolve-se aumentando artificialmente as taxas de retenção na fonte de IRS sobre o trabalho dependente e as pensões.
Ora é exactamente isso que está a acontecer: Andamos todos a pagar IRS adiantado, acima do que é devido.
Quanto a 2005, ficámos a fazer que o governo ia fazer o mesmo, pela boca imprudente do Ministro.
Chama-se a isto antecipar receitas, que é o que fazem as pessoas falidas.
No ano em que as taxas de retenção na fonte forem só as que a lei permite, haverá um crash de 18% nas receitas fiscais e uma crise gravíssima nas Finanças Públicas.
O que é admirável, é que o Diário Económico do dia 10 do corrente dizia que todos estamos a descontar de IRS 22% acima do devido, e nenhum partido político exigiu ao governo a reposição da legalidade.
É isso que se impõe.
Este é um dos casos em que as instituições não estão a funcionar, enquanto o governo viola a lei e a fazer-nos todos os meses um assalto ao ordenado.
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