quarta-feira, setembro 29, 2004

Vou resmoer este Editorial, em férias!

Amanhâ, é o meu último dia de trabalho. Seguem-se 15 dias de férias! Preparo já alguma leitura para levar. Interessado pela coisa pública vou resmoer este editorial da "Capital" de hoje, por uns dias. É só imprimir. Dei, também uma espreitadela.

O palácio de Santana Lopes

LUÍS OSÓRIO

As diferenças abissais entre os líderes do PSD e PS não favorecem em nada Santana Lopes. Sabendo disso, mais tarde ou mais cedo, o actual primeiro-ministro tentará impor um compromisso de silêncio com os seus ministros, tentará sobretudo assinar um pacto com Paulo Portas e Morais Sarmento de forma a personalizar na sua figura o que for essencial. Santana Lopes acredita muito mais em si e no seu instinto do que nas reais intenções de quem o rodeia. Como o seu exército de fiéis é formado por gente sem expressão, tem de contar agora com o apoio efectivo de homens e mulheres que não lhe prestam vassalagem e que, em alguns casos, desprezam a forma como exerce o poder.
Está por isso numa encruzilhada táctica de muito difícil resolução. Uma encruzilhada que poderá resolver de duas formas possíveis. A primeira, mais conservadora, é tentar resistir e passar nestes dois anos a ideia que é o elo forte do governo e o menos culpado pelas falhas que, a continuarem no ritmo imparável dos últimos dias, tornar-se-ão fonte do anedotário nacional. Tentará vitimizar-se e jogar tudo nas eleições legislativas. Dirá então aos portugueses que, agora sim, poderá governar sem o contrangimento da herança de Durão Barroso, da crise económica e das dúvidas de Sampaio. Se optar por esta via, Santana Lopes terá ínfimas hipóteses de ganhar e, pior do que isso, José Sócrates reunirá condições para a conquista de uma maioria absoluta. Porque a vitimização terá a resistência de uma parte do governo, também ele fiel à herança de Durão, e porque nenhum governo chegou a esta fase tão dilacerado. Pela falta de credibilidade, pela ausência de legitimidade e pela agonia económica de uma classe média que é quem decide eleições.
Por isso, Pedro Santana Lopes poderá tentar um golpe mais ousado. Um golpe que, a ser feito, baralhará os dados do jogo, mas que seria sempre uma espécie de tudo ou nada na sua carreira política. Nesse golpe, o primeiro-ministro faria cair o governo e provocava eleições antecipadas. Não deixava o PS organizar a casa e poderia argumentar que tinha sido o seu sentido de Estado a empurrá-lo para o sacrifício de governar sem poder decidir em total liberdade. Mas que agora, até pela clarificação no seio da oposição, tinha chegado o momento de os portugueses poderem escolher entre si - sem as terríveis amarras do PP e a crise de legitimidade do seu governo - e José Sócrates. Devolveria ao povo, onde realmente se sente bem, o ónus de uma escolha onde poderia ter uma hipótese de salvar a honra. Nessa arriscada jogada, a percentagem de ter um bom resultado eleitoral seria bem maior do que se deixar o seu poder arder em lume brando.
Contudo, o futuro para Santana Lopes é tudo menos risonho. Nos corredores da sua corte toda a gente desconfia de toda a gente e a paz é podre. O primeiro-ministro tem o apoio do povo no seu partido e, mais tarde, tentará usá-lo contra as sombras que todos os dias crescem no palácio. As elites, expulsas das salas onde se decide, esperam cá fora pela sua oportunidade. Em silêncio e sem visível contestação. Santana Lopes não os tolera, mas tentará convencer alguns a entrar. Nesse equívoco morrerá sem honra nem glória. Só os mais humildes entre os seus o poderão salvar.


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